O Homem Que Calculava (11m 5f)


O Homem Que Calculava

 

 Adaptão de Victor M. SantAnna do livro “O HOMEM QUE CALCULAVA” de Malba Tahan, para teatro escolar.

Atenção: não possuo os direitos autorais desta peça. Fiz apenas a adaptação do mesmo, a pedido de uma professora de matemática! Procure os herdeiros de Malba Tahan ou a editora do livro “O Homem que Calculava” sobre questões relacionadas aos direitos autorais!

Notas

  • A única personagem mulher da história original é Telassim, filha do Xeque. Portanto, criei mais personagens, sendo quatro estudantes, todas do sexo feminino. No entanto, com isso, o número de personagens aumentou para dezenove. O projeto demanda que o número de atores seja mantido em dezesseis, logo, uma das maneiras de resolver esta questão é fazer com que os sete sábios que surgem ao final da peça sejam interpretados por 4 atores do sexo masculino distintos e também pelos mesmos atores que aparecem nas cenas iniciais: os 3 irmãos da “Cena 3”, inteirando o total de 7 personagens sábios.
  • A adaptação não ficou tão boa quanto eu gostaria, já que a maioria dos problemas matemáticos apresentados no livro teve de ser suprimida por questões de tempo ou de impossibilidade de apresentação, pois estes seriam difíceis de ser visualizados através da narração. Entretanto, sugiro que alguns desses problemas sejam distribuídos ao público em cópias impressas, seja na forma de quebra-cabeças ou de curiosidades. Isso pode ocorrer antes do início da peça ou no final da mesma.
  • A peça foi dividida em três partes, cada uma representada em um cenário diferente. A primeira parte ocorre na aldeia onde Beremiz conhece o Mercador, a segunda parte acontece no palácio do pai de Telassim e a terceira parte se passa no palácio do Califa.
  • Como eu não tinha uma noção clara do tempo ideal para a peça inteira, escrevi três cenas que podem ser descartadas sem representar qualquer prejuízo à peça. São elas:
    • “Cena 1 – Quatro estudantes precisam encenar uma peça”;
    • “Cena 9 – Os primeiros quatro testes”, na qual os quatro primeiros sábios interrogam Beremiz. Com o corte da cena 9, o número de sábios passa a ser apenas três, representados pelos mesmos atores dos 3 irmãos. Cada uma destas cenas contém quatro atores que serão retirados do texto. A retirada das duas cenas diminuiria o número de atores de dezesseis para oito;
    • “Cena 6 – A história do sumiço de uma moeda”, que trata-se de uma conversa entre Beremiz, o Xeque Iezid e o Mercador.
  • Há vários pontos da peça onde outros atores podem fazer figuração. As cenas no interior dos palácios do Xeque Iezid e do Califa podem ser ocupadas por novos personagens. O quarto de Telassim pode conter escravos (eunucos ou aias) e o palácio do Califa, escravos, ministros e guardas.
  • Na cena 8, a resposta de Beremiz ficou bastante extensa, já que ele precisa contar uma longa fábula. Tentei reduzir ao máximo esta parte, mas a encenação teria uma melhora significativa caso seis personagens, vestidos de animais, pudessem ilustrar a narração de Beremiz. Os personagens seriam: o leão, o tigre e o chacal (ou hiena) e suas três presas (que na minha adaptação, podem ser o mesmo animal: ovelhas ou porquinhos, por exemplo).
  • Uma variação interessante, caso seja necessária uma maior interação com a platéia, é fazer com que as cenas finais, no palácio do Califa, tenham a participação de algumas pessoas do público no papel de escravos ou de guardas. O Califa pode exigir a presença de seus escravos pessoais e de um ou mais guardas, que vão até o público e selecionam algumas pessoas para segurar um “abano” (leque) próximo ao Califa. Na minha concepção de peça escolar, eu imagino este papel sendo executado por professores escolhidos entre o público pelos próprios alunos que interpretam a peça.
  • Igualmente, os papéis dos sábios (um ou mais deles) poderão ser interpretados por professores da escola. São papéis que podem ser representados por pessoas que não ensaiaram a peça, já que os “atores” apenas precisariam ler as perguntas formuladas a Beremiz. Ao chamar os sábios, o Califa pode citar seus nomes verdadeiros, como por exemplo: “Entre ‘fulano de tal’, sábio vindo da sala dos professores”.

 

Victor, 9 de agosto de 2005

O HOMEM QUE CALCULAVA

Adaptão de Victor M. SantAnna do livro “O HOMEM QUE CALCULAVA” de Malba Tahan, para teatro escolar.

Personagens

4 estudantes femininos
3 irmãos
Mercador
Beremiz Samir (matemático)
Telassim (filha do Xeque Iezid)
Xeque Iezid Abul-Hamid (pai de Telassim)
Califa (rei)
7 sábios (que também poderiam ser interpretados por um único ator, que neste caso, seria apenas 1 sábio que formula 7 problemas)

 

Roteiro

I PARTE – Aldeia de Beremiz

Cena 1 – Quatro estudantes precisam encenar uma peça

Na cena, está Beremiz ao fundo, sozinho, concentrado em alguma coisa.
Estudantes entram em cena, conversando.

Estudante 1Ah! Eu não aguento mais ler sobre matemática!
Estudante 2: Calma! É para o nosso trabalho… quantas páginas você já leu?
Estudante 1: Só uma! E já não aguento mais!
Estudante 3: Ah, só uma!?
Estudante 4: Uma é muito pouco! Precisamos fazer o trabalho sobre o livro de Malba Tahan, como a professora pediu!
Estudante 2: “O Homem que Calculava”… nem é um livro tão grande!
Estudante 1: Mas eu abri o livro justamente naquele problema dos quatro quatros! Ele não me deixa em paz!
Estudante 2: O problema dos quatro quatros?
Estudante 4: Ah, sei. É o problema de fazer os números de zero até cem usando qualquer operação: mais, menos, vezes…
Estudante 2: Você quis dizer adição, subtração, multiplicação e divisão…
Estudante 3: E sempre usando como números quatro algarismos “quatro”.
Estudante 4: Veja, por exemplo, o zero… quatro mais quatro, menos quatro, menos quatro. Isso dá zero!
Estudante 3: E o “um” seria quatro mais quatro divididos por… quatro mais quatro!
Estudante 2: (pensando em voz alta e contando nos dedos) Quatro mais quatro é oito… que dividido por oito, dá um!
Estudante 1: Matemática! Por que não podemos fazer um trabalho sobre uma linda história de amor?
Estudante 4: Isso! Uma história de uma princesa que conhece alguém que ganha grandes tesouros! Eles se apaixonam, casam e vivem felizes para sempre!
Estudante 2: Esperem aí! Este livro é justamente sobre isso!
Estudante 3: Eu li quase todo o livro. Acho que é só imaginar o que acontece…

O foco da luz sai dos estudantes e vai até Beremiz. Os estudantes saem de cena.

Cena 2 – Beremiz e Mercador se conhecem

Beremiz(está concentrado e de repente fala) Um milhão, quatrocentos e vinte e três mil, setecentos e quarenta e cinco! (volta a ficar concentrado)

Entra o Mercador, que passa na frente de Beremiz.

Mercador: (curioso) Por Alá! O que será isso? 
Beremiz: Dois milhões, trezentos e vinte e um mil, oitocentos e sessenta e seis!
Mercador: (olhando receoso, fala com Beremiz) Quem é você e o que significam estes números?
Beremiz: Forasteiro! Sou Beremiz Samir e estou calculando o número de folhas que há em cada árvore desta área!
Mercador: Em nome de Alá, clemente e misericordioso! Incrível! Um homem com a habilidade de realizar cálculos tão complexos não deveria estar aqui, mas sim em Bagdá, exibindo estes cálculos ao Califa!
Beremiz: Sempre quis conhecer outros lugares e, se tivesse como viajar, iria a Bagdá!
Mercador: Quer seguir comigo, Beremiz Samir? Eu viajo a Bagdá!
Beremiz: Você fez um convite com oito palavras e quarenta e uma letras. Portanto, responderei também com oito palavras e quarenta e uma letras: ficarei feliz em seguir você para Bagdá, mercador!
Mercador: Você é um calculista mesmo! Um amigo meu procura um professor para sua filha! Já procurei por toda a Pérsia e ainda não encontrei ninguém quem queira ensinar matemática a uma mulher! Venha comigo e poderá ser empregado como professor dela!
Beremiz: Que curioso! Poucos pais se preocupam com o ensino de Matemática aos seus filhos… muito menos para suas filhas! Está combinado!
Mercador: Ótimo! Iremos em meu camelo, já que só há um para dois de nós! Precisaremos dividi-lo na viagem!
Beremiz: Divisão! A matemática está realmente por toda parte!

Ambos estão saindo de cena, quando, subitamente, entram três irmãos.

Cena 3 – A partilha

Beremiz e Mercador estão saindo de cena, mas param para ouvir a discussão dos três irmãos.

Irmão 1: É impossível!
Irmão 2: Mas é o último desejo de nosso amado pai!
Irmão 3: Só um grande matemático poderá nos ajudar!
Mercador: Por Alá! O que é isso? Alguém aqui falou que precisa de um matemático?
Irmão 1: Nosso pai nos deixou uma herança impossível de ser dividida!
Irmão 2: Nosso amado pai pediu que nossos trinta e cinco camelos sejam divididos segundo suas instruções!
Irmão 3: Mas é impossível fazer a divisão!
Irmão 1: Eu devo receber a metade da herança e trinta e cinco dividido por dois dá dezessete e meio!
Irmão 2: Eu devo receber um terço, mas a terça parte de trinta e cinco não é um número exato!
Irmão 3: Eu devo ficar com a nona parte, mas também não é um valor exato. Não quereremos sacrificar nenhum animal para fazer a partilha correta!
Mercador: Beremiz! É possível realizar esta divisão?
Beremiz: A solução é simples caso vocês consintam que eu junte aos seus trinta e cinco camelos o camelo de meu amigo!
Mercador: Ei, espere aí! É nosso único camelo!
Beremiz: Confie em mim! Ceda seu camelo e verá como tudo dará certo!
Irmão 1: Não acredito no que estou ouvindo! Como é que os camelos poderão ser divididos com este artifício?
Irmão 2: Se a partilha puder ser resolvida, o pagaremos pela solução do problema!
Beremiz: A solução é esta: ao irmão mais velho, cabe a metade dos camelos. Como, agora, são trinta e seis camelos, ele ficará com dezoito camelos!
Irmão 2: E a minha parte? Meu irmão saiu lucrando, pois ao invés de receber dezessete camelos e meio, recebeu dezoito!
Mercador: Um terço de trinta e seis… deixa eu pensar.
Irmão 3: São doze! Meu irmão receberá doze camelos! E a minha nona parte?
Beremiz: E você também sairá lucrando: um nono de trinta e seis camelos são quatro camelos!
Irmão 3: Estou muito satisfeito!
Irmão 2: Eu também! E proponho que o calculista seja recompensado!
Irmão 1: Muito justo! O que podemos fazer para pagar seus cálculos?
Mercador: Espere! Agora, como faremos nossa viagem? Ficamos sem nenhum camelo!
Beremiz: A soma dos camelos que couberam a cada irmão é dezoito mais doze mais quatro, resultando em trinta e quatro camelos! Sobraram, portanto, dois camelos! Proponho que um camelo seja devolvido ao mercador!
Irmão 1: Aceitamos a proposta! Obrigado, meu bom homem!
Irmão 2: E proponho, ainda, que o outro camelo que sobrou seja dado, como pagamento pela divisão, ao calculista Beremiz Samir!
Irmão 3: Assim seja! Que Alá proteja um calculista tão hábil!

Todos saem, os irmãos para um lado e o Mercador e Beremiz por outro.

II PARTE – Palácio do Xeque Iezid

Cena 4 – O Xeque Iezid fala com sua filha

Ambos estão em um palácio, em um cômodo decorado com almofadas.

Xeque Iezid: Minha filha, Telassim! Pedi a um amigo meu ir em busca de um professor de matemática, para que o seu destino possa ser alterado. Em poucos meses, você estará fazendo aniversário!
Telassim: Meu pai, não se preocupe com a previsão dos astrólogos!
Xeque Iezid: Uma série de desgraças foram previstas caso você não tenha aprendido matemática até o seu décimo oitavo aniversário!
Telassim: Eu tenho aprendido matemática através dos livros de nossa biblioteca! Por que haveria de me preocupar? Confie em mim. Meu destino será feliz!
Xeque Iezid: Prefiro não arriscar! O calculista acabou de chegar a Bagdá e virá agora mesmo para dar suas primeiras aulas!

Palmas são escutadas, anunciando que alguém entrará.

Xeque Iezid: Deve ser ele!

Telassim esconde-se atrás de um biombo.

Cena 5 – Beremiz e a primeira aula a Telassim

Entram Beremiz e o Mercador. Eles são cumprimentados pelo Xeque Iezid.

Xeque Iezid: Obrigado por aceitar meu convite!
Mercador: Não irá se arrepender, meu amigo! Beremiz se mostrou ser um grande calculista e ter um enorme coração durante nossa viagem!
Beremiz: Não precisa se preocupar com nada! Podemos começar nossas primeiras lições?

O Xeque conduz Beremiz até uma almofada, na qual dará aulas a Telassim. Ele volta a conversar com o Mercador, enquanto Beremiz dá aulas a Telassim, ao fundo.

Mercador: Deixa-me contar um dos feitos de Beremiz durante a viagem até aqui. Ele é capaz de cálculos prodigiosos!
Xeque Iezid: Que cálculos poderá um matemático fazer no meio do deserto!?
Mercador: Estávamos em pleno deserto quando encontramos o Xeque Salém Nasair, que havia sido atacado por nômades persas!
Xeque Iezid: Salém Nasair, um dos mais ricos mercadores de Bagdá, amigo pessoal do Califa?
Mercador: Sim, o salvamos! Em troca, ele prometeu nos pagar cada pão que comesse com uma moeda outro!
Xeque Iezid: Devia estar morrendo de fome!
Mercador: Eu tinha apenas três pães e Beremiz tinha cinco, logo, deveríamos receber oito moedas de ouro…
Xeque Iezid: Ora, essa divisão até eu sou capaz de fazer. Oito moedas de ouro, uma para cada pão: você recebeu, portanto, três moedas e Beremiz recebeu a pequena fortuna de cinco moedas de ouro!
Mercador: Errado! Beremiz provou que esta conta estava matematicamente errada!
Xeque Iezid: Como pode ser possível?
Mercador: Dividíamos, na viagem pelo deserto, cada pão em três pedaços e cada um comia um pedaço. Como, de cada pão, eu comia um pedaço e Beremiz comia outro pedaço, sobrava um pedaço para O Xeque Salém Nasair…
Xeque Iezid: Deixe-me ver se entendi… eram oito pães, ou seja, vinte e quatro pedaços. Portanto, cada um comeu oito pedaços de pão.
Mercador: Exato! Como eu tinha três pães, foram nove pedaços de pão. Eu comi oito pedaços, logo, o Xeque Samir comeu apenas um pedaço dos meus pães… mas Beremiz tinha cinco pães…
Xeque Iezid: Eram quinze pedaços! Portanto, Como ele próprio também comeu oito pedaços, sobraram sete comidos por Salém Nasair! Logo, ele recebeu sete moedas e você apenas uma!
Mercador: Errado! Não foi isso o que aconteceu!
Xeque Iezid: Errado? Mas não é essa a divisão matematicamente correta?
Mercador: Sim, mas Beremiz pegou as suas sete moedas e deu-me três delas! Ele explicou que a divisão matemática não era correta aos olhos de Deus e dividiu igualmente as moedas, quatro para cada um de nós!
Xeque Iezid: Que homem incrível! Alá sabe o que faz! Tenho certeza que ele será o melhor professor que Telassim poderá ter!

Beremiz levantou-se de onde estava e aproximou-se do Xeque Iezid e do Mercador.

Beremiz: A primeira lição está terminada! Estou encantado com os conhecimentos de sua filha! Ela é muito inteligente!
Xeque Iezid: Ela estuda matemática desde que aprendeu a ler!
Beremiz: Deve ser a mulher mais inteligente da Pérsia!

Cena 6 – A história do sumiço de uma moeda

Xeque Iezid: Beremiz! Antes que você e seu amigo partam, tenho uma questão que está intrigando a mim e a dois amigos meus… o desaparecimento de uma moeda!
Beremiz: Conte o que aconteceu e verei se posso resolver o problema…
Xeque Iezid: Eu e mais dois amigos fizemos uma refeição numa hospedaria. Como a refeição iria custar trinta moedas, cada um de nós deu dez moedas.
Mercador: Ora, essa divisão é simples, até eu resolvo!
Xeque Iezid: Acontece que o dono da hospedaria, um homem honesto, percebeu que havia se enganado. A refeição deveria ter custado apenas vinte e cinco moedas. Logo, ele mandou seu empregado devolver cinco moedas. Como era difícil dividir cinco moedas por nós três, resolvemos dar duas moedas ao empregado, como gorjeta, e ficamos cada um com uma moeda.
Beremiz: Até aqui, não vejo nenhum problema!
Mercador: Nem eu! Qual é o problema afinal?
Xeque Iezid: Como cada um de nós deu dez moedas e recebeu uma de volta, pagamos, no total, nove moedas cada um. Nove vezes três é igual a vinte sete. Somadas às duas moedas dada ao empregado, vinte e nove! Das trinta moedas iniciais, está faltando uma, portanto!
Beremiz: Não vejo problema nenhum. A apresentação da conta, explicada desta maneira, está incorreta. Gostaria de tentar resolver a questão, meu amigo mercador?
Mercador: Ah! Acho que é simples: deixa eu pensar. Eram dez moedas para cada um, dando o total de trinta moedas. Cada um recebeu uma moeda de volta, pagando no total nove, ou seja, vinte e sete no total. Se o empregado ficou com duas moedas, a explicação é muito simples: o empregado deve ter perdido a moeda que falta! Só pode ser isso!
Beremiz: Nada disso, meus amigos! Eram trinta moedas, mas cinco foram devolvidas. O dono da hospedaria ficou com vinte e cinco, o empregado ficou com duas e cada um dos pagantes ficou com uma moeda, o que dá o total de trinta moedas! Resumindo, dos vinte e sete pagos, o dono da hospedaria ficou com vinte e cinco e o empregado ficou com duas moedas! É simples!
Xeque Iezid: Sim, agora entendo… Passamos muitos dias pensando nisso e nunca percebemos a resposta! Agora parece simples mesmo!
Mercador: Eu também conseguiria achar a resposta se tivesse pensado mais um pouco!

Cena 7 – Beremiz termina a primeira aula e parte

Xeque Iezid: Beremiz, suas lições são muito importantes para o destino de minha filha! Quero que vocês fiquem juntos até que ela tenha aprendido tudo o que puder ensinar a ela!
Beremiz: Gostaria de dizer que nunca conheci alguém que me encantasse tanto assim. Quer dizer… (fica meio sem jeito) estou falando dos conhecimentos em matemática. Estou muito feliz por ficar próximo a Telassim. Digo… ensinando matemática.
Mercador: Vamos, Beremiz! Não podemos ficar aqui. Lembre-se de nosso compromisso com o Califa!
Xeque Iezid: O Califa? Nosso rei quer receber vocês?
Mercador: As aventuras de Beremiz chegaram aos ouvidos do Califa e ele quer lhe propor um desafio! Temos de ir até o palácio!
Xeque Iezid: Então vão de uma vez! Não convém deixar o rei esperando!

Saem Beremiz e o Mercador.

Telassim: (sai de trás do biombo) Meu pai! Este deve ser o homem mais sábio de toda a Pérsia!
Xeque Iezid: Minha filha! Parece que vejo em seus olhos o brilho da paixão!

Telassim e Xeque Iezid saem, enquanto conversam.

Telassim: Será que os astrólogos que anunciaram que eu deveria estudar matemática não o fizeram para que eu pudesse conhecer meu futuro noivo?
Xeque Iezid: Eu ficaria muito feliz em ter um homem tão brilhante como Beremiz como genro!

III PARTE – Palácio do Califa

Cena 8 – O Califa e as provas a Beremiz

O Califa está sentado num trono, em um palácio, quando entram Beremiz e o Mercador. Ambos se aproximam e reverenciam o rei.

Califa: Então estes são os homens que salvaram a vida do meu amigo Xeque Salém Nasair! (levanta-se do trono e age fraternalmente) Quem salva um amigo meu, também é meu amigo! Qual de vocês é o grande calculista?
Beremiz: (aproxima-se um pouco mais do trono) Meus conhecimentos de matemática são apenas o que aprendi em meus humildes estudos!
Califa: Seus feitos já ultrapassaram as fronteiras! Vários sábios de outros países vieram para Bagdá, a meu convite, para testar seus conhecimentos! Se você passar em todos os testes, prometo que grandes riquezas serão sua recompensa!
Beremiz: Estou pronto para realizar o que o Califa desejar!

Cena 9 – Os primeiros quatro testes

Califa: Que entre o sábio matemático vindo de Cairo! 

Entra o primeiro sábio.

Mercador: Que Alá proteja Beremiz!
Sábio 1: Jovem Beremiz! Sou Mohadebe Abner-Rama, professor de teologia e retórica. As perguntas que farei são simples.
Beremiz: Estou pronto!
Sábio 1: Quantas são as suratas do Alcorão?
Beremiz: Cento e catorze!
Sábio 1: Quantos versículos?
Beremiz: Seis mil, duzentos e trinta e seis!
Sábio 1: Número de palavras?
Beremiz: Quarenta e seis mil, quatrocentas e trinta e nove!
Sábio 1: Quantas letras?
Beremiz: Trezentos e vinte e três mil, seiscentas e setenta letras!
Sábio 1: Quantos profetas são citados?
Beremiz: Vinte e cinco!
Califa: Chega! Beremiz já provou que tem ótima memória e que conhece o Alcorão! Quero outro tipo de prova! Que entre o próximo sábio!

O primeiro sábio sai resmungando. Entra o segundo sábio.

Sábio 2: Sou historiador, portanto, minha pergunta será sobre a história da matemática. Um calculista deve saber mais do que apenas números. Quero que responda a uma única pergunta: quem foi o geômetra célebre que morreu de desgosto por não poder olhar o céu?
Beremiz: Foi Eratóstenes! Ele dirigiu a grande biblioteca da Universidade de Alexandria até o fim dos seus dias, quando ficou cego durante uma vigem pelo Nilo!
Sábio 2: Exato! Resposta perfeita! Considero-me, Califa, plenamente satisfeito com a resposta!
Califa: Que entre outro sábio!

Sai o segundo sábio e o terceiro sábio entra.

Sábio 3: Sou o astrônomo Abul-Hassã Ali e quero saber se é possível tirar uma regra falsa de uma propriedade verdadeira!
Beremiz: Sim. Digamos, por exemplo, que eu pegue os números dois mil e vinte e cinco, três mil e vinte e cinco e nove mil, oitocentos e um e extraia a raiz quadrada de cada um.
Sábio 3: Quarenta e cinco, cinqüenta e cinco e noventa e nove!
Beremiz: Sim, isso mesmo. Mas o número vinte e o número vinte e cinco, que escritos juntos formam o número dois mil e vinte e cinco, se somados dão quarenta e cinco…
Sábio 3: Que é a raiz de dois mil e vinte e cinco. Sim, claro… o mesmo ocorre com trinta mais vinte e cinco, que formam o número três mil e vinte e cinco. Também noventa e oito e um, que formam o número nove mil oitocentos e um!
Mercador: Não estou entendendo nada. Não podem escrever isso em algum lugar?
Califa: Boa idéia! Escreva os números para que possamos ver melhor!

Beremiz escreve os números em um quadro, para que a platéia os visualize.

Beremiz: Vejam, neste caso, alguém pode concluir que a raiz de um número de quatro algarismos é a soma dos números formados pelas duas metades, o que nem sempre é verdade!
Sábio 3: Muito bem! Ótimo exemplo! Estou plenamente satisfeito com a resposta!
Califa: Que entre Jalal Ibn-Wafrid; poeta, filósofo e astrólogo.
Sábio 4: Desejo, ó calculista, verificar se você é capaz de unir o material ao espiritual e chegar a resolver não só os problemas humanos, mas também as questões transcendentes. Qual é a multiplicação famosa, conhecida na história da humanidade, multiplicação que todos os homens cultos conhecem e que na qual só figura um único fator?
Mercador: Essa pergunta não tem sentido!
Beremiz: (pensa por alguns segundos) A única multiplicação famosa, com um único fator, é a multiplicação dos pães, feita por Jesus, filho de Maria! Nesta multiplicação só há um fator: o poder milagroso da vontade de Deus!
Sábio 4: Muito bem respondido! É a resposta mais perfeita que já ouvi até hoje!
Califa: Muito bem, vamos continuar com o desafio. Quatro sábios já foram! Restam três!

Cena 10 – Beremiz é interrogado por um dos três últimos sábios

Califa: Beremiz! Caso consiga vencer o desafio e responder corretamente a todas as perguntas formuladas pelos três sábios que entrarão agora, darei-lhe um fortuna em ouro ou um palácio em Bagdá!
Mercador: Por Alá! Por que eu nunca estudei matemática!?
Califa: Chamem um dos sábios que questionarão Beremiz!

Entra o quinto sábio que fará perguntas a Beremiz.

Sábio 5: Sou o Xeque Nascif Rahal. Para mim, o valor de um sábio só pode ser medido por sua imaginação. Quero que o matemático Beremiz Samir nos conte uma fábula em que apareça a divisão de três por dois e que não deixe resto!
Mercador: Como uma divisão que não é exata poderá não deixar resto?
Beremiz: A fábula que contarei envolve três animais: O leão, o tigre e o chacal, que saíram juntos para caçar.
Califa: Gostei! Continue!
Beremiz: Os três caçadores logo encontram suas presas… três animaizinhos indefesos! O Leão, rei dos animais, pede ao tigre que efetue a divisão simples de três por três: os três animais caçados pelos três caçadores.
Mercador: Muito boa esta história! Está indo bem!
Beremiz: O tigre, tentando ser esperto, pega a melhor presa para si mesmo e deixa o leão furioso. Sem paciência nenhuma, o Leão mata o tigre com uma patada. Em seguida, o leão faz o mesmo convite ao Chacal: quer que ele faça a divisão entre os três animais caçados pelos dois caçadores que sobraram. O Chacal, percebendo que sua vida depende de sua resposta, anuncia que o resultado da divisão de três por dois, é muito simples: é três! Três animais para o Leão, que é o rei e merece ficar com todas as presas! E o resto é zero, que é a parte dele… Por isso o Chacal, até hoje, come apenas a carcaça deixada pelo banquete de um leão.
Sábio 5: Estou muito satisfeito com a fábula a nós relatada! Considero Beremiz digno de todos os prêmios oferecidos pelo Califa!
Califa: Beremiz, você foi muito bem neste teste e não tenho dúvida que irá conquistar os seus merecidos prêmios. Antes de chamar o sábio que formulará o próximo problema, gostaria de saber se tem algum pedido que deseja ser realizado?
Beremiz: Ao invés de tesouros ou um palácio, desejo apenas uma coisa: casar-me com Telassim, filha do Xeque Iezid. Gostaria que o Califa tornasse isso possível!
Califa: Este é um pedido fora do comum! Chamem o Xeque Iezid para saber o que ele pensa a respeito! Se Iezid concordar, os noivos terão todo o meu apoio! Enquanto isso, peço que entre o sábio que fará a próxima pergunta!

Cena 11 – Beremiz é interrogado pelo penúltimo sábio

Entra o sexto sábio, que fará a penúltima questão a Beremiz.

Sábio 6: Vou narrar um problema e quero que Beremiz resolva. Um rei resolveu escolher o noivo de sua filha através de uma prova, chamada “a prova dos cinco discos”. Eram três príncipes e havia cinco discos, sendo dois pretos e três brancos; cada um dos príncipes teve um dos discos amarrado nas suas costas. Eles não tinham como saber qual era o seu disco ou qual era a cor dos dois discos que tinham sobrado. Quem descobrisse a cor do disco nas suas costas, seria o vencedor. Ao primeiro príncipe, foi permitido ver o disco dos outros dois candidatos, mas ao dar um palpite sobre a cor do seu próprio disco, errou e foi eliminado. Ao segundo príncipe, foi permitido ver o disco do concorrente que sobrou, mas ele também errou ao tentar descobrir a cor do seu próprio disco e foi eliminado. O último, de olhos vendados, acertou a cor do disco que tinha nas costas. O problema é: qual era a cor do disco do príncipe que ganhou a prova?
Beremiz: Este é um problema de lógica e é bem simples. O primeiro príncipe errou, logo sabemos que nas costas dos outros dois príncipes não havia dois discos pretos, já que existiam apenas dois. Se fossem pretos, ele teria acertado facilmente o disco que havia em suas costas!
Califa: Gostaria de entender melhor isso. Há como demonstrar de uma maneira mais fácil de entender?

Beremiz pega cinco pratos que estão disponíveis em alguma mesa, por exemplo, sendo três pretos e dois brancos, entrega um disco preto ao mercador e um disco preto ao sexto sábio.

Beremiz: Veja, se ambos tivessem discos pretos atados em suas costas, eu teria de ter um dos discos brancos em minhas costas!
Califa: Muito bem, agora estou entendendo!
Mercador: Eu também! Mas e como saber qual era a cor destes discos?
Beremiz: Sabemos que não eram pretos, mas o segundo príncipe, ao saber que o primeiro havia errado, também sabia disso. Portanto, ele tinha certeza que ele e o príncipe que havia sobrado tinham, ou dois discos brancos, ou um disco preto e um branco. O segundo príncipe, ao olhar as costas do terceiro, errou. Errou porque não teve certeza, porque teve um palpite errado. Vejam…

Há um disco preto com o sexto sábio. Beremiz tira o disco que estava com o mercador.

Beremiz: Meu amigo mercador… se você fosse o segundo príncipe e visse que o terceiro príncipe tem um disco preto em suas costas, sabendo que os dois discos não podem ser pretos ao mesmo tempo, adivinharia qual seria a cor do disco que você teria nas costas?
Mercador: Branco! Meu disco teria de ser branco!
Califa: Muito bem! Entendi! O segundo príncipe errou, logo o terceiro príncipe não pode ter um disco preto com ele!
Beremiz: Por isso, o último príncipe tinha certeza de que seu disco era branco. Ele ganhou a prova!
Sábio 6: Estou plenamente satisfeito! Resposta inteligente, simples e lógica! Que Alá abençoe tão brilhante mente!

Cena 12 (Final) – A última questão

Palmas são escutadas, anunciando que alguém entrará no recinto real. Entram o Xeque Iezid acompanhado de Telassim.

Xeque Iezid: Aqui estou, meu Califa! Vim assim que fui chamado! Consultei minha filha Telassim e ela concorda em casar-se com o jovem calculista Beremiz!
Califa: Quero que Telassim assista a última prova, que determinará se Beremiz receberá todos os prêmios… ou se perderá tudo!
Xeque Iezid: Assim seja!

Telassim e o Xeque Beremiz afastam-se um pouco.

Califa: Que entre o último dos sábios a questionar Beremiz!

Entra o sétimo sábio.

Sábio 7: A pergunta que devo fazer a Beremiz é simples. Um rei tinha pérolas maravilhosas, oito no total. As pérolas eram idênticas em tudo, impossível de serem diferenciadas uma da outra, exceto uma, que, mesmo tendo o mesmo tamanho, era um pouco mais leve do que as demais. Usando uma balança de braços muito precisa, que permitia comparar duas medidas, seria fácil determinar qual era a mais leve: bastaria comparar, duas a duas, as oito pérolas, até achar a mais leve. A pergunta é: é possível encontrar a pérola mais leve fazendo apenas duas pesagens?
Beremiz: Ora, esse problema não apresenta nenhuma dificuldade. Vamos demonstrar de forma prática. Veja… meu amigo mercador fará o papel de balança.

Beremiz puxa o Mercador para o centro do palco e faz com que ele estique os braços como se fosse uma “gangorra”.

Beremiz: Das oito pérolas, pego três e coloco em um dos braços da balança e as outras três coloco no outro braço. Se a balança ficar equilibrada, é lógico que, das duas pérolas que estão fora da balança, uma delas será a que é mais leve!

Beremiz estica os braços também imitando uma balança e, como se estivesse segurando uma pérola em cada mão, desequilibra a balança para um dos lados.

Sábio 7: E caso a balança tenha se desequilibrado na primeira pesagem?
Beremiz: Caso isso aconteça, eu saberia, em que grupo de três pérolas estaria a mais leve, veja…

Beremiz volta ao mercador e faz com que ele baixe uma mão levantando a outra.

Beremiz: Olhe, se este grupo de três pérolas contém a pérola mais leve, posso fazer uma segunda pesagem usando apenas uma pérola em cada prato da balança. (finge pegar as três pérolas do braço mais alto do mercador)

Beremiz faz com que o sábio imite uma balança, da mesma forma que fez com o mercador.

Beremiz: Deste jeito, com uma pérola em cada braço, se a balança ficar desequilibrada, saberei qual é a mais leve. Caso a balança fique equilibrada, a pérola mais leve será a terceira, que está em minha mão!
Sábio 7: Muito bem! Perfeito! A resposta foi simples e correta! Estou plenamente satisfeito!
Califa: Beremiz, jovem sábio! Também estou satisfeito e emocionado com tanta sabedoria! Que Alá seja louvado pela prodigiosa demonstração da capacidade humana que vimos hoje aqui! Quero fazer um anúncio! (falando ao público) Não apenas dou um palácio a Beremiz e uma fortuna em ouro já prometida, como também nomeio Beremiz Samir tesoureiro de meu reino! 

Telassim e Beremiz se aproximam e se abraçam, enquanto o Califa, o Xeque Iezid e o Mercador aproximam-se por trás e cumprimentam os noivos.

Califa: Que aos noivos nunca falte nada!
Xeque Iezid: Que tenham vida próspera!
Beremiz: (pega a mão de Telassim e fala ao público) E que a nossa felicidade traga felicidade para todos!

Termina a cena com todos agradecendo ao público.


Adaptão de Victor M. SantAnna do livro “O HOMEM QUE CALCULAVA” de Malba Tahan, para teatro escolar.

Atenção: não possuo os direitos autorais desta peça. Fiz apenas a adaptação do mesmo, a pedido de uma professora de matemática! Procure os herdeiros de Malba Tahan ou a editora do livro “O Homem que Calculava” sobre questões relacionadas aos direitos autorais!

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